Para muitos é um frangueiro, para mim é um herói

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Estive no Porto um dia e meio, conversei com os dirigentes e o acordo estava praticamente feito. Fiquei num hotel mas não consegui dormir, passei a noite em claro, porque tinha chegado a acordo mas não era aquilo que eu queria. Financeiramente era muito bom, melhor que a primeira abordagem feita pelo Benfica, na altura pelo José Veiga, mas a minha vontade, desde a altura em que cheguei a Portugal, sempre foi jogar no Benfica, um clube que admirava muito. Um dos objectivos que então tracei foi esse: jogar um dia no Benfica.

Até no aquecimento para os jogos era assobiado! Sentir isto, na própria casa, deixava-me muito triste. Foram casos a mais que condicionaram os três anos e meio que lá estive e que me levaram a falar com o presidente e a pedir a rescisão.

Não eram todos, mas aí uns setenta por cento, os que nunca me apoiavam. Ao invés, era assobiado. E agora, representando um clube adversário, sei lá! Devo ouvir apupos mas também acredito que possa ser bem recebido por parte de alguns. O Benfica tem bons adeptos, dos melhores do país, e eu não esqueço um certo carinho que me dispensavam na rua.

Saí a uma bola, o adversário fez um carrinho e fui atingido no joelho. O choque provocou imensas dores. Eu no chão, lesionado e com dores, e o estádio a chamar pelo Moreira… Foi o pior momento. Naquela noite falei com o presidente e disse que não podia continuar no Benfica. Fiquei mais um ano, depois ainda fui para a Grécia, voltei, mas não havia hipóteses.

...o apoio que hoje ainda tem o Moreira, que na altura tinha também o Quim. Eu nunca senti esse apoio. E isso, para mim, era muito doloroso.

Se tenho currículo e nome é graças ao Benfica, não me arrependo de nada. Estarei sempre grato ao clube pela oportunidade que me deu de poder vestir aquela camisola.


Palavras de um dos jogadores mais humilhados pelos próprios adeptos dos últimos anos, que deveriam envergonhar todos os benfiquistas, mesmo aqueles que, como eu, nunca o apuparam. O sósia holandês do Tintin tem culpas no cartório, porque não soube ter sensibilidade para gerir a entrada do Moretto no Benfica, mas 90% da culpa é dos muitos benfiquistas que, durante o aquecimento e os jogos, nunca se cansaram de enxovalhar o jogador, retirando-lhe qualquer hipótese de sucesso e minando-lhe a confiança até esta ser zero.

É perfeitamente compreensível que cada adepto tenha o seu herói e o seu odiozinho de estimação no plantel (eu, por exemplo, abomino o Jorge Ribeiro, digo cobras e lagartos do rapaz mas nunca o assobiei no estádio), mas essa diferenciação deve cingir-se a conversas com amigos, no café, em casa, em blogs, etc. No estádio, onde as coisas doem a sério e onde se decidem títulos, todos os jogadores têm que ser tratados como heróis. Porque enquanto vestirem aquela camisola, é isso que eles são.

E mesmo com outra camisola vestida, o Moretto demonstra grande classe e prova que foi mesmo um herói ao suportar o que suportou. Nas suas palavras na entrevista ao Nojo, não há rancor, não há ódio nem sentimento de vingança. Há apenas tristeza e um orgulho imenso em ter representado o Benfica. Não é para todos.